Entre aspas...

sábado, 28 de maio de 2011




Estive pensando nesse mistério que faz com que a vida da gente se encante tanto por outra vida. E sinta vontade de escrever poemas. Garimpar estrelas. Deixar florir pelo corpo os sorrisos que nascem no coração. Nesse mistério que nos faz olhar a mesma imagem inúmeras vezes, sem cansaço, seja ela feita de papel ou de memória. Que nos faz respirar feliz que nem folha orvalhada. Querer caber, com frequência, no mesmo metro quadrado onde a tal vida está. Cantarolar pela rua aquela canção que a gente não tinha a mínima ideia de que lembrava.

Estive pensando nesse mistério que faz com que a vida da gente encontre essa vida na multidão planetária de bilhões de outras. E sem saber que ela existia, perceba ao encontrá-la que sentia saudade dela antes de conhecê-la. Estive pensando nesse mistério que faz com que aquela vida que acaba de encontrar a nossa nos deixe com a impressão de estar no nosso caminho desde sempre, como se fosse um sol que esteve o tempo todo ali e a gente somente não o ouvia cantar. Nesse mistério que nos faz trocar buquês dos olhares mais cuidadosos. Que nos faz querer cultivar jardins, lado a lado. Nesse mistério que faz com que a nossa vida queira um bem tão grande à outra vida, que vai ver que isso já é uma prece e a gente nem desconfia.


Estive pensando nesse mistério lindo que você é para alguém e alguém é para você ou que ainda serão um para o outro. Nessa oportunidade preciosa dos encontros que nos fazem crescer no amor também com o tempero bom da ludicidade. Nesse clima de passeio noturno em pracinha de cidade pequena. Nessa paz que convida o coração pra recostar e repousar cansaços. Nesse lume capaz de clarear quarteirões inteirinhos da alma e acender um mundaréu de vontades no corpo. Nesse abraço com braços que começam dentro da gente. Nessa vontade de deixar o mundo todo pra depois só para saborear cada milímetro do momento embrulhado pra presente.


Estive pensando nesse mistério que não consigo desvendar. Nem tento.




(Esse Mistério - Ana Jácomo)

Sobre o amadurecimento das coisas!

sexta-feira, 20 de maio de 2011

  

  Sabemos que coisas boas nos aguardam sempre. Em nosso coração sempre existe aquela chama, uma voz que diz que o que tanto almejamos irá chegar. Os nossos sonhos serão realidade e teremos felicidade plena! Isso é muito bonito... até quando nos permitimos esperar, até quando conseguimos nos conter na paciência e na calma.
  Há momentos em que o desespero bate! Nós sabemos que o desejo se realizará, mas fixamos nossos olhos somente no tempo, e começamos a reclamar que está demorando tempo demais, que já não suportamos mais tamanha espera. Nos dias de hoje, a pressa tem reinado, e já não conseguimos aguardar um pouquinho a mais de tempo.
  Como uma fruta, as coisas também precisam de tempo para amadurecer, para caírem boas em nossas mãos e, enfim, podermos apreciá-las. Mas não conseguimos aguardar! Desejamos tudo á nossa maneira, e esquecemos que cada mínima coisa possui seu tempo exato de amadurecimento.
  E é por isso que perdemos tanto na vida. Temos pressa, “metemos os pés pelas mãos”,  e antes que nosso fruto amadureça, o arrancamos do pé sem ele estar pronto!E o que acontece? Ele acaba morrendo. As coisas murcham, e se esvaem por entre nossos dedos. Ao vermos essa triste cena, nos arrependemos, mas é tarde demais para lágrimas e pedidos de desculpa. O fruto já morrreu! Agora é a hora de plantar outro e, não esquecer, de esperar seu tempo certo de amadurecimento, para que possamos experimentá-lo e fazê-lo duradouro!


" Esse é um dos capítulos mais difíceis do livro-texto 
e do caderno de exercícios: 
o aprendizado do respeito ao sábio tempo das coisas. "
(Ana Jácomo) 

Entre aspas...

terça-feira, 10 de maio de 2011





"Apenas desejo intensamente que você não avance demais para não cair do outro lado.Você tem de ser equilibrista até o fim da vida. E suando muito, apertando o cabo da sombrinha aberta, com medo de cair, olhando a distância do arame já percorrido e do arame a percorrer — e sempre tendo de exibir para o público um falso sorriso de calma e facilidade. Tem de fazer isso todos os dias, para os outros, como se na vida não tivesse feito outra coisa, para você como se fosse sempre a primeira vez, e a mais perigosa. Do contrário seu número será um fracasso."

(Fernando Sabino para Clarice Lispector)

É impossível dizer adeus!

segunda-feira, 2 de maio de 2011

  

  Cheguei na estação em cima da hora, no momento exato em que o motorista anunciou a partida do trem, e a tempo de te ver, pela última vez, de relance. Somente ali eu havia descoberto o motivo de seu repentino e, até ali, inexplicável sumiço, o motivo de seu silêncio e das inúmeras ligações rejeitadas. Medo! Mais uma vez ele havia lhe travado.
  Vivemos um amor de verão. Intenso, forte e lindo! Um mês que mais parecera uma eternidade – ou talvez eu desejasse que houvesse sido realmente assim. Ocorreram entre nós coisas que jamais poderiam ocorrer com outras pessoas durante anos. Amamos de todas as formas possíveis. Sorrimos, choramos, brigamos, entretanto, movidos pela magia do sentimento, esquecemos que em pouco tempo o verão terminaria. Aliás, corrigindo: eu esqueci, você não!
  Na última semana você sumiu. Me deixou preocupada, com medo que algo de ruim houvesse lhe acontecido. Sofrendo e chorando ao pensar que, para você, tudo havia sido somente uma brincadeira. Sumiste, me impedindo de entrar em contato contigo, e me fazendo pensar que havia acabado.
  Entretanto, hoje eu entendo. Foi medo. Medo de se apegar mais, de sofrer, de me fazer sofrer, de pisar no terreno desconhecido do amor. Sobrou medo e faltou coragem! Coragem de olhar nos meus olhos pela última vez e dizer adeus, coragem de dizer aos outros que ficaria, coragem de fazer o que seu coração implorava e não o que as pessoas esperavam que tu fizesse.
  Mas eu sei... sei que me amas, e que o medo te impede de viver e ser feliz. Sei que está sofrendo e que agora, no momento em que o trem faz a curva e some no horizonte, você reluta em olhar para trás, e uma lágrima escorre por tua face, enchendo de líquido salgado os teus lábios, que receberam meu beijo doce, no momento em que vês uma foto nossa que tiraste do bolso.
  Dou meia volta, também chorando, e começo a andar retornando para casa. Derrepente tropeço e olho para o chão. Acabo de tropeçar em seu coração, envolvido com um laço de fita, e com um bilhete que assim diz: “Para minha doce amada!”. Você partira mas seu coração ficara, afinal ele pertencia a mim. E eu cuidaria dele como minha vida – pois assim ele o era.


"Sobrou desse nosso desencontro, um conto de amor sem ponto final."
(Chico Buarque )